sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça...

Muito se discute sobre a (remota) possibilidade de extinção dos órgão periciais em favor dos setores de análise pericial do Ministério Público (MP). Particularmente, acho essa hipótese uma verdadeira aberração jurídica: como o MP, parte do processo, supriria provas pericias a uma corte? Em tese, no foro penal, essa labuta cabe aos auxiliares da justiça e não à(s) parte(s).

Nesses termos, a Quinta Turma do Superior Tribuna de Justiça (STJ) decidiu o que segue abaixo. Ao que parece, essa "coisa mais linda, mais cheia de graça" é um direcionamento jurisprudencial em favor da (óbvia) manutenção dos órgãos periciais. Observem:

Quinta Turma

LAUDO PERICIAL. CRIPTOANÁLISE. DESENTRANHAMENTO. AUTOS.

A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, concedeu a ordem de habeas corpus para reconhecer a ilicitude do laudo pericial de criptoanálise e determinar o desentranhamento dos autos. Esse laudo é uma interpretação sofisticada de anotações codificadas constantes em agenda, contudo realizada de forma unilateral pelo MP. Segundo o Min. Relator, o habeas corpus pretendeu, em síntese, o reconhecimento da ilicitude de laudo pericial de criptoanálise produzido por profissional ligado ao MP (órgão acusador) sem a participação do réu ou do magistrado. Destacou ainda que, embora a prova tenha sido produzida na vigência do art. 159 do CPP, com a redação dada pela Lei n. 8.862/1994, tanto o texto anterior quanto o atual da Lei n. 11.690/2008 exigem que a perícia seja feita por perito oficial, distinguindo-se apenas quanto à quantidade de técnicos necessária para a realização dos exames. No caso, a busca e apreensão da agenda cuja perícia se contesta foram realizadas em 28/11/2007, ocasião em que foi apreendida em poder do paciente acusado de envolvimento em crimes contra a ordem tributária, de lavagem de dinheiro e de quadrilha. No entanto, a criptoanálise da agenda só ocorreu em 19/8/2008, quando já em curso o processo criminal. Assim, observou o Min. Relator que não se trata de perícia feita durante a fase policial tampouco feita em situação de urgência diante do risco de desaparecimento dos sinais do crime ou pela impossibilidade ou dificuldade de conservação do material a ser examinado. Dessa forma, explicou que a perícia foi realizada sem observância dos postulados do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, já que produzida por servidora que compõe o quadro do MP em vez de órgão destinado exclusivamente à produção de perícias. Ademais, asseverou que foi produzida sem que houvesse autorização, controle judicial ou mesmo possibilidade de a defesa ofertar quesitos, de nomear assistente técnico, ou de manifestar-se sobre a eventual suspeição ou impedimento do perito, de acordo com o disposto no art. 159, §§ 3º e 5º, do CPP. Para a tese vencida, primeiro não houve impugnação da perícia pelos meios próprios da defesa, mas em habeas corpus como substitutivo processual. Por outro lado, considerou que a iniciativa do MP de juntar o laudo técnico com as interpretações da agenda regularmente apreendida em diligência não constitui a prova pericial prevista no art. 159 do CPP, nem tem valor de prova produzida sob direção judicial, seria apenas oferta de documento da parte, ou seja, prova extrajudicial legalmente admissível. Não seria, portanto, caso de desentranhar o laudo dos autos por considerá-lo ilícito ou inválido, sem que o juiz primeiro apreciasse seu valor, segundo sua livre avaliação das provas, isso antes do encerramento da instrução processual ou das alegações finais, ocasiões em que seria possível verificar se houve prejuízo à defesa. HC 154.093-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 9/11/2010.

Fonte: http://www.stj.jus.br/SCON/infojur/doc.jsp (Número: selecione o 455)

2 comentários:

  1. O grande e mais obvio problema que temos ao dar presseguimento em nossos sonhos é esse, talvez por passar tanto tempo estudando para "chegar lá", esquecem dos ideiais o levaram até lá! É totalmente incoerente, é todo um sistema que já está velho e totalmente manipulado, está na hora de reformas, porém, deve se atentar sempre aos minimos detalhes, que sempre farão toda a diferença, principalmente no que tange a cerca do direito penal, onde a base são provas, e pericias... sitema tupiniquim...

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  2. Não sei ao certo se o problema é a "tupiniquinidade" de nosso sistema ou se trata-se de um litígio por uma área que ganha cada vez mais espaço. A perícia ficou por muito tempo desvalorizada e isso está mudando; em parte pelo efeito CSI, em parte pelo reconhecimento social das provas objetivas (periciais).

    O MP só quer estar na crista da onda. Mas, para tal, não é necessário assumir atribuições que não são deles. Bastar dar as mãos aos órgãos periciais. Nosso compromisso é com a verdade, não com o litígio.

    Salute.

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