quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Perícia, Copa e Olimpíadas

Após a euforia de conseguir trazer a Copa 2014 e as Olímpiadas de 2016 para o Brasil, a fatura começa a ser apresentada ao contribuinte. E aos Peritos.

Fonte da figura: DiskMan Blog

Estavam previstas 1200 desapropriações imobiliárias para a construção do novo corredor de ônibus T5, o Transcarioca. Agora, segundo o Diário Oficial de 14/12/2009, esse número Triplicou!!! (Fonte: Globo.com)

Conforme já foi citado aqui em outro post baseado no site da Conjur, o Laudo válido para desapropriar um imóvel é aquele da Perícia Oficial.

Assim, já sugiro os colegas do Rio de Janeiro irem estudando o assunto e, como 95% da verba é federal, conversando com os colegas da Polícia Federal para ver como "matar" essas 3.630 pendências, que não serão fáceis! E ainda tem a Copa do Mundo...

Esse é um momento maravilhoso para a Polícia Técnica. É a hora ideal para elaborar projetos de infra-estrutura, solicitar novos concursos, etc... Estou a pouco tempo na perícia, mas vi que o PAN do Rio já trouxe muitos benefícios para a classe, imagina o potencial de uma Copa + Olimpíadas.

Fora as áreas óbvias, como bombas e explosivos, precisamos abrir a mente e enxergar novos problemas como a parte de avaliação dos imóveis a serem desapropriados, lavagem de dinheiro, impactos ambientais e licenciamento das obras, etc e tal.

É uma boa oportunidade de mostrar a importância do Perito, demostrando que os benefícios sociais de uma Perícia bem estruturada valem a pena frente ao seu baixo custo para a sociedade. Vejo um desafio para a classe, pois se os Peritos Oficiais não tomarem a frente na solução dessas pendências, certamente serão utilizados outros estudos técnicos de TCU, Ministério Público, Peritos ad hoc, charlatões, etc... aí já viu, né?!

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Auxílio ao ócio prisional


Este post não é exatamente pericial. Mas trata de um tema que, como tantos outros, incomoda aqueles que trabalham com aspectos criminais.

Hipoteticamente, você, pai de família, está passando por um período de dificuldade financeira e não consegue garantir o sustento de seus dependentes. Parte seu coração ver sua esposa e seus três rebentos em necessidade. Homem direito como é, você se sacrifica buscando um (ou outro) emprego para resolver essa amargura. Sem sucesso.

Em um ato de desespero, você parte para a criminalidade. Mas, homem direito que é e sem a malandragem inerente aos marginais, é pego logo no primeiro roubo. É julgado e condenado a 4 anos de reclusão (pena mínima prevista no art. 157 do Código Penal).

Assim que é encarcerado, vem a surpresa: sua família que passava necessidades passa a receber R$ 3008,48 mensalmente enquanto você estiver preso. E a dificuldade financeira, que foi a gênese de todo o episódio, está sanada!

Ok, eu sei, nobre leitor. Parece uma anedota criminal. Mas, para nosso infortúnio, não é. Trata-se do auxílio-reclusão, "um benefício devido aos dependentes do segurado recolhido à prisão, durante o período em que estiver preso sob regime fechado ou semi-aberto", nas palavras da Previdência Social. Eu procurei explorá-la em um conto em que o protagonista era um homem de bem. No entanto, tal benefício tem sido concedido majoritariamente a pessoas de má fé.

De acordo com a Portaria nº 48, de 12 de fevereiro de 2009, o valor a ser pago é de R$ 752,12 por dependente. Cá entre nós, na anedota acima, quantos pais de família com três filhos ganham um salário de R$ 3008,48 ou superior? A fundamentação por trás desse auxílio-reclusão é que o recluso não pode trabalhar para garantir o sustento de sua família. Pergunto: aquele pai de família, que foi vítima de um latrocínio, pode trabalhar para garantir o sustento de sua família? Há benefício semelhante à família vitimada?

Em suma, se não bastasse o meliante encarcerado viver às custas do Estado, que gasta o equivalente a R$ 1700,00 por presidiário, ou 11 vezes o que se gasta com um estudante de ensino fundamental, ele é beneficiado com a garantia de consciência tranquila de que sua família não passará necessidades. Isso, pois receberá um auxílio pelo ócio do meliante em um estabelecimento prisional, já que a Constituição Federal proíbe os trabalhos forçados (penso em começar uma campanha para mudar o nome de Auxílio-Reclusão para Auxílio-Ócio-Prisional). Sem contar, é claro, com outros benefícios como as saídas temporárias (erroneamente chamadas pela imprensa de indulto) de natal, dia dos pais, páscoa, dia das mães... E ainda queimam colchões quando não há TV a cabo nas celas.

Mas o crime não compensa.

Pense nisso.


Obs.: Aos que duvidam, consultem as seguintes legislações:
- Lei nº 8.213, de 24/07/1991
- Decreto nº 3.048, de 06/05/1999
- Instrução Normativa INSS/PRES nº 20 de 10/10/2007
- Portaria nº 48, de 12/2/2009

sábado, 26 de dezembro de 2009

Perícia em Tráfico de Animais

De acordo com dados do sítio do Ibama, "Calcula-se que o tráfico de animais silvestres retire, anualmente, cerca de 12 milhões de animais de nossas matas; outras estatísticas estimam que o número real esteja em torno de 38 milhões".

Olhando na feira livre, parece uma negócio pouco expressivo, mas pássaros legalizados premiados em exposições chegam a valer R$ 30.000,00 e são trocados por carros e casas. No exterior, esse valor é maior ainda, o que estimula o tráfico internacional.

Espécies de animais silvestres podem ser criadas em cativeiro com autorização do Ibama, mas não podem ser retiradas do seu ambiente natural. Sempre me perguntam "Como eu faço pra legalizar meu passarinho? Não quero ser multado". A orientação é para entregar seu animal junto a um Centro de Triagem de Animais Silvestres do IBAMA onde biólogos/veterinários vão dar a melhor destinação para o animal, seja a soltura em ambiente natural ou acomodação em zoológico. Não há como legalizar um animal que nasceu na natureza.

Ocorre que os animais não costumam andar com suas Certidões de Nascimento. No caso das aves, o que comprova sua origem legal é a presença de anilhas legítimas, com diâmetro compatível com o porte da espécie, que possibilite a colocação no animal jovem e não no adulto. Mas como o tráfico de animais envolve muito dinheiro, sempre há um espertinho falsificando anilhas e tentando "legalizar" animais selvagens.

Nessa hora entra o perito criminal, responsável pela caracterização de eventuais maus tratos, análise das anilhas e identificação das espécies animais verificando se as mesmas encontram-se em risco de extinção. Normalmente se observa a Lista da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (CITES). Alguns estados, como Minas Gerais, ainda possuem sua própria lista de animais ameaçados.

Mas como verificar se a anilha é original? Entre em contato com o Ibama. Lá eles possuem padrões compravadamente originais para comparação e manual de fiscalização de anilhas. Mais detalhes não são disponibilizados aqui por motivos óbvios. Mas já adianto que, em geral, as falsas possuem diâmetros maiores do que o normatizado pelo Ibama, possibilitando a colocação em animais adultos vindos da natureza para "esquentá-los".

Para quem trabalha com segurança pública, prender um falsificador de anilhas é gratificante, pois não se enquadra na Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/98), de penas brandas, e sim no código penal (Decreto-Lei 2.848/40). Trata-se de falsificação de selo ou sinal público (anilhas oficiais), que dá de 2 a 6 anos de prisão.

Jaula Neles!

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Presente de Natal

Neste link podem ser encontrados diversos livros sobre ciência forense. Os livros são em inglês. Se tiver um tempinho para fuçar, esse site tem links pra diversos outros tipos de revistas e livros sobre os mais diversos assuntos.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Mini-Revólver: Aspectos Legais

Esses dias vi um documentário sobre Bob Munden, dono de 18 recordes mundiais de tiro. Mesmo sem minha sonhada banda larga no Amapá, me preparei para deixar baixando pela madrugada alguns vídeos sobre ele quando me aparece um link de um vídeo sobre o menor revólver funcional do mundo.



É lindo. É um chaveirinho que atira. Parece um brinquedo. Parece uma jóia. Será que qualquer um pode comprar um desses?

A utilização de armas de fogo no Brasil é disciplinada pelo Decreto Nº 3.665/2000, que dá nova redação ao Regulamento para a Fiscalização de Produtos Controlados (R-105), classificando armas de fogo em Uso Permitido (com o devido porte de arma, conforme o caso) e Uso Restrito (só para forças policiais e militares). “Brinquedos” como armas de pressão com munições menores que 6mm, por exemplo, são de uso permitido.

Lá, revólver é definido como “arma de fogo de porte, de repetição, dotada de um cilindro giratório posicionado atrás do cano, que serve de carregador, o qual contém perfurações paralelas e eqüidistantes do seu eixo e que recebem a munição, servindo de câmara;” Ok. Legalmente, nosso brinquedo é um revólver!

“Art. 16 São de uso restrito:
(...) IX - armas de fogo dissimuladas, conceituadas como tais os dispositivos com aparência de objetos inofensivos, mas que escondem uma arma, tais como bengalas-pistola, canetas-revólver e semelhantes;”

“Art. 17 São de uso permitido:
I - armas de fogo curtas, de repetição ou semi-automáticas, cuja munição comum tenha, na saída do cano, energia de até trezentas libras-pé ou quatrocentos e sete Joules e suas munições, como por exemplo, os calibres .22 LR, .25 Auto, .32 Auto, .32 S&W, .38 SPL e .380 Auto”

Agora é uma questão de interpretação. Alguém poderia dizer que tem cara de chaveirinho ou brinquedo, tendo aparência de inofensivo e, portanto, sendo enquadrada como arma de uso restrito. Ocorre que a energia na saída do cano de seus mini-projetis, de acordo com o vídeo linkado acima, é de cerca de 1 Joule, bem inferior aos 407 Joules da legislação, o que a tornaria de uso permitido. Para dar uma noção, o manual minha pistolinha de brinquedo (de bolinhas de plástico) diz que ela tem 0,5 Joule e não machuca nem a queima-roupa. Uma espingarda de chumbinho de 5,5mm, por outro lado, pode chegar a 20 Joules e machucar bastante.

Voltando a R-105, seu artigo 8 diz que "A classificação de um produto como controlado pelo Exército tem por premissa básica a existência de poder de destruição ou outra propriedade de risco que indique a necessidade de que o uso seja restrito a pessoas físicas e jurídicas legalmente habilitadas, capacitadas técnica, moral e psicologicamente, de modo a garantir a segurança da sociedade e do país." Portanto, acredito que a premissa básica do poder de destruição não é preenchida o que, para mim, significa que podemos comprar esse novo brinquedinho.

Eis uma boa indicação de presente para o Natal!

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Vida Dura do Perito

Esta notícia realmente foi publicada no Jornal O Globo desta terça (15/12/2009).

E eu pensando que era duro fazer perícia em poluição de lixão.

Não achei o assunto interessante nem quero estudar mais sobre o assunto, apenas divulgo o tema com o intuito de estimular as concurseirAs a se tornarem futuras peritas! :)

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

"Autonomia técnica, científica e funcional"!

Hoje, 17 de dezembro de 2009, se completam 90 dias da publicação, no Diário Oficial da União (Seção 1, pág. 1), da Lei nº 12.030, de 17 de setembro de 2009, que "dispõe sobre as perícias oficiais e dá outras providências".

Mas por que falar desta Lei hoje, três meses depois da publicação? Fácil: diz o referido dispositivo, em seu artigo sexto, que "esta Lei entra em vigor 90 (noventa) dias após a data de sua publicação". Ou seja, a partir de hoje, "no exercício da atividade de perícia oficial de natureza criminal, é assegurado autonomia técnica, científica e funcional, exigido concurso público, com formação acadêmica específica, para o provimento do cargo de perito oficial" (artigo segundo).

Presumo que, em vigor, essa Lei deve derrubar uma série de Ações Diretas de Inconstitucionalidade propostas Brasil a fora contra a criação de Polícias Científicas como órgãos independentes das Polícias Civis. O argumento quase sempre gira em torno da não previsão constitucional de órgãos policiais de perícia (o artigo 144 da Constituição Federal de 1988 prevê as polícias: polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares e corpos de bombeiros militares).

Outra questão que emerge desta Lei é a questão da realização de "concurso público, com formação acadêmica específica". Em outras palavras, os concursos para a carreira de perito criminal não mais poderão ser abertos a qualquer formação universitária, mas sim áreas específicas. Em algumas unidades da federação, como São Paulo, Minas Gerais, e Distrito Federal por exemplo, os concurso passados não determinavam qual a formação acadêmica necessária para prestar o certame. Qualquer pessoa com diploma universitário poderia prestar. Outros estados, como Paraná, Pará e Tocantins, além da própria Polícia Federal, já seguem há algum tempo a proposição desta Lei: as vagas do concurso são divididas por área de formação acadêmica.

Particularmente, penso que essa é uma discussão equilibrada. A carreira pericial demanda conhecimentos interdisciplinares, em especial quando se labuta em regime de plantão em que o próximo caso a ser atendido pode ter tipificações tão diferentes quanto um homicídio e um crime contábil. Logo, a figura do perito genérico, como alguns têm chamado, não é de todo ruim. Uma visão ampla do fato típico é muitas vezes almejada.

Por outro lado, quanto mais generalista o perito, menos precisos são seus relatos. O conhecimento específico de um fenômeno fomenta consignações de grande relevância científica e, portanto, aproxima a investigação da tão buscada verdade real. E esse conhecimento apenas o especialista deve dominar. Conheço colegas que conhecem certas áreas com a profundidade da Fossa das Marianas, mas ficam restritos àquela área. Outros colegas possuem um conhecimento vasto como um oceano, mas raso com um copo d'água.

Um dos grandes desafios na carreira de um perito criminal está relacionado a sua constante formação profissional. Ponderar seus conhecimentos é necessário: saber o que é possível com a maior propriedade que dispuser, recorrendo a quem detenha o conhecimento quando preciso.

Muita discussão já foi realizada acerca do tema. Mas isso não impede que continuemos debatendo as ideias. Fica aqui o espaço aberto para a continuidade das discussões dessa temática. Aos interessados, utilizem o espaço de comentários para expor suas opiniões.

Saudações,

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Perícia e Academia: uma parceria promissora

Há algum tempo venho comentando com amigos e colegas dos dois mundos, o acadêmico e o pericial, sobre a necessidade de diálogo entre eles. Muito do conhecimento nascido em ambiente acadêmico é aplicável aos meios periciais. Em um giro oposto, a perícia criminal possui uma demanda infindável por novas técnicas. Traduzindo em "método científico": a perícia traria as perguntas, a academia viria com as respostas.

Cá em "terra que tem palmeiras, onde canta o sabiá" essa cooperação é rara e, quando ocorre, é por iniciativa de um perito ou de um pesquisador isoladamente. O ideal seria uma parceria institucional entre os órgãos periciais e as universidades. Por que isso não ocorre? Talvez nosso problema seja histórico: órgão periciais ainda possuem conotação policial; polícia e universidade deixaram de se misturar desde a famigerada ditadura.

Mas somos brasileiros, não desistimos nunca. Exemplo disso foi a iniciativa de quatro doutorandos do Instituto de Química (IQ) da UNICAMP e quatro peritos criminais da Polícia Federal (PF). Gustavo Braga Sanvido, Renato Haddad, Ramon Sarabia Neto e Livia Eberlin, do Laboratório Thomson de Espectrometria de Massa do IQ, tiveram a colaboração de Ricardo Cosso, Denison Maia, Adriano Maldener e José Jorge Zacca, peritos criminais da PF, para desenvolver uma nova técnica de detecção de cédulas falsas.

A análise tem por base a espectrometria de massa aplicada a uma superfície e foi batizada de Easy Ambient Sonicspray Ionization (EASI). Segundo o Jornal da Unicamp, "A técnica identifica, por meio de análise química, as características dos compostos presentes nas cédulas, obtendo a resposta em dez segundos. 'A cédula verdadeira tem como presença constante quatro íons, chamados de íons diagnósticos', afirmou Sanvido. Se esses íons não estiverem presentes, a cédula é falsa."



Há, ainda, outras aplicações para a nova técnica relacionadas à análise documental. O exame de superfície permite avaliar assinaturas, explorando os íons da tinta utilizada e, assim, confrontando se foram ou não realizadas por uma mesma caneta. “Existem vários fatores que podem atacar a tinta original, entre os quais o oxigênio e a luz. Mesmo que a pessoa utilize uma caneta da mesma marca, isso não garante que ficará igual. A composição do corante também é diferente e, dessa maneira, fica provado que o documento foi alterado posteriormente à assinatura”, explica Sanvido.

Este trabalho foi aceito para publicação no Journal of Forensic Science, um dos mais importantes periódicos da área pericial. Fica aqui minhas congratulações aos autores e que a parceria sirva de exemplo para futuras colaborações.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

21 gramas: o peso da alma?

Alguns fenômenos cadavéricos são tão intrigantes que, no passado, foram motivo de análise sobrenatural. Profissionais de reputação ilibada fizeram afirmações que hoje incitariam o riso de muita gente. A desidratação tegumentar (ou dessecação) é um desses fenômenos e exploraremos uma conclusão falaciosa dela historicamente derivada: o peso da alma.

No início do século XX, um médico americano de nome Duncan MacDougall quis provar que a alma exite. Pensou que, se de fato exite a alma, ela deve ser material. Sendo constituída de matéria, a alma deve ter massa e, consequentemente, peso. Se tem peso, deve ser possível medí-lo. Com base nesse raciocínio, o Dr. MacDougall mediu o peso de seis pessoas antes e depois de morrer e reparou que o fiel da balança sempre tendia para a queda do peso do já cadáver paciente.

O primeiro era um tuberculoso prestes a morrer. Segundo o Dr. MacDougall, logo após a morte, o inidivíduo perdeu 21g de sua massa, portanto esse deveria ser o peso da alma (uso o termo "peso" aqui lato sensu, sem a conotação de força física). O segundo paciente teria perdido 46g, ao passo que o terceiro perdeu 14g imediatamente e mais 28g após alguns minutos. Então, se interpretarmos esses dados, concluiríamos que a alma de pessoas diferente tem massas diferentes, certo? E ainda: algumas almas deixam o corpo aos poucos (vide o terceiro paciente). A interpretação dada ao autor do experimento foi que essas diferenças se relacionavam ao temperamento de cada um: o terceiro paciente seria apático (para não dizer lerdo) e sua alma teria permanecido em suspensão sobre o corpo até notar que estava livre.

Talvez Duncan MacDougall não conhecesse os fenômenos cadavéricos abióticos. O corpo sem vida perde água para o ambiente a uma taxa que varia com o tempo: quanto maior o tempo decorrido do evento morte, mais baixa essa taxa. Logo, a perda de massa que ele observou provavelmente decorreu da perda de água por dessecação tegumentar. Em indivíduos com temperatura corporal aumentada ante mortem, como é comum nas infecções e em paciente hospitalizados, a desidratação ocorre mais rapidamente. Será que a diferença de peso medida não era decorrente da dessecação?

Dr. MacDougall diria que não. Ele realizou experimentos semelhantes com cachorros e não constatou qualquer variação no peso. Concluiu que homens têm alma, cães não têm. Mas os cães têm o tegumento recoberto por pêlos e não possuem glândulas sudoríparas. A taxa de dessecação em seus corpos certamente é mais lenta que em seres humanos.

Outras questões pertinentes:

1) a morte não é um instante no tempo, mas um processo que se estendo por algum período. A diferença de massa, portanto, decorre da desidratação do corpo durante o processo de morte;

2) como argumentou um colega legista, quando da morte, os esfíncteres relaxam. Seria possível que gases intestinais tivessem sido liberados logo após a morte. Como todo gás tem peso, a liberação desses gases acarretaria perda de peso, ainda que pequena (que tal 21g?).

Duncan MacDougall perdeu seus 21g em 16 de outubro de 1920. Neste dia, o The New York Times publicou sua morte no obituário com o título "Ele pesou a alma humana".

Para os curiosos, segue abaixo um link com o texto original do artigo publicado em 1907 pelo Dr. MacDougall sobre a hipótese da materialidade da alma:

MacDougall, D. 1907. Hypothesis Concerning Soul Substance, Together with Experimental Evidence of the Existence of Such Substance. Journal of the American Society for Psychical Research 5(1): 237-275.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

4 de dezembro: Dia do Perito Criminal

Em 15 de abril de 2008, o Congresso Nacional decretou e o Presidente da República sancionou a Lei 11.654 que "institui o dia 4 de dezembro como o Dia Nacional do Perito Criminal". Tal lei veio a instituir nacionalmente o que o Estado de Minas Gerais já havia instituído em 1982 (vide a Lei Estadual 8.380 de 23 de dezembro de 1982).

De 1982 para os dias atuais, muita coisa mudou. Mas a busca pela verdade real, que norteia as aspirações da justiça criminal, permanece a mesma. E o Perito Criminal, como auxiliar da justiça, continua a navegar nos mesmo mares jurisdicionais, a buscar a mesma verdade real e a conferir cientificidade à materialidade do crime.

Parabéns aos colegas Peritos Criminais por esta data. Que a cada ano possamos comemorar as vitórias da classe e aspirar melhorias constantes na qualidade de nossa atividade, tão importante para a justiça!